Um fazendeiro durão trava uma guerra de ameaças contra a nova esposa do irmão e seu filho adolescente, até que antigos segredos vêm à tona.

TUDO ESTÁ NOS DETALHES

The power of the dog, nome original em inglês, é um trecho de uma passagem bíblica que se mostra muito importante ao final do filme. Ataque dos cães é dividido em partes e dá para perceber que há muito mais através da superfície do que é mostrado na história. Tudo está nos detalhes.

Benedict Cumberbatch vive Phil, um fazendeiro que, apesar de formado em filosofia em Yale, resolveu tocar a vida sendo um cowboy. Mas se você espera que esse vá ser um filme western comum, engana-se. Aqui temos uma trama que é bem parada, que não entrega muito sobre os personagens, mostrando somente a superfície mesmo.

Phil é o total oposto de seu irmão. Ele é grosso, rude, sujo e violento. Mas há mais do que as aparências, pois Phil usa essa persona que ele criou para esconder justamente a sua orientação sexual e partes de si mesmo que ele repudia. Tanto que vemos o quão horrível é a reação dele a Peter, filho de Rose, que é um garoto mais sensível e possui as características que Phil despreza.

REPÚDIO A FEMINILIDADE

É interessante notar também que a aversão que Phil sente a Peter e também a Rose tem relação com a feminilidade que os dois carregam. Phil odeia Rose e sua proximidade com seu irmão, ao mesmo tempo que não tolera a personalidade de Peter. Os dois possuem características que Phil esconde atrás de sua personalidade durona. Tanto que é apenas em momentos sozinhos que ele se deixa libertar, como na cena em que ele toma banho isolado.

Jane Campion foi muito perceptiva na sua direção, usando de detalhes que podem passar percebidos para contar essa história. Há muitas cenas em que pequenos gestos dos personagens dizem muito e a forma como a fotografia foi utilizada é muito inspiradora e bela, com enquadramentos que até lembram alguns filmes western antigos. Ao mesmo tempo que os campos dos ranchos são vastos, os personagens parecem confinados. Seja dentro deles mesmos ou presos por vícios e situações das quais não conseguem fugir. Até mesmo o clima parece de suspense e até mesmo terror, principalmente pela personalidade de Phil que muitas vezes é monstruosa.

Isso tudo aliado, é claro, a uma atuação certeira de Benedict Cumberbatch, que é quem mais se destaca aqui. A escolha do ator foi proposital, pois ele não parece pertencer àquele espaço, o que causa ainda mais estranhamento. Benedict traz aqui o temperamento estourado, mas também um pouco da sutileza que habita dentro de Phil, mas que não consegue sair totalmente.

TÍTULO BÍBLICO E O COMPLEXO DE ÉDIPO

Como falado, o título do filme em inglês remete a uma passagem da Bíblia. Numa tradução livre seria: “livra minha alma da espada, e minha querida do poder do cão”. Essa frase, lida por Peter ao final do filme, resume muito bem sobre o que é Ataque dos cães. Peter, no início do filme fala que é claro que ajudaria sua mãe e vemos que a ligação dos dois é forte. Durante todo o filme, Rose é atormentada por seus vícios e ainda mais por Phil. Há algumas cenas que sutilmente nos levam a crer que Peter fará alguma coisa para livrar sua mãe desse tormento, mas é só ao final do filme que tudo fica mais claro.

Aqui também entra o complexo de Édipo. O complexo de Édipo é um conceito que foi defendido pelo psicanalista Sigmund Freud, que se refere a uma fase de desenvolvimento psicossexual da criança, chamada fase fálica, em que ela começa a sentir desejo por sua mãe e ódio e ciúme de seu pai. No caso do filme, eu não diria que Peter sente algum desejo por sua mãe, devido a sua sexualidade, que fica subentendida. Mas é claro que o garoto é protetor quanto a mãe.

Dá para entender que o “livra minha alma da espada” seria sobre Peter, sobre a libertação dele, já que vemos o quão em paz ele é quanto a sua personalidade e possivelmente orientação sexual. Já o “minha querida” seria Rose e “o cão” seria Phil. Até porque Phil assume, depois de um tempo, uma figura paterna para Peter, o que se aplica ao complexo de Édipo. Como todo resto do filme, é preciso se atentar aos mínimos detalhes para entender o final. Mas acredito que esse seja o trunfo de Ataque dos cães: “show, don’t tell”, ou seja, “mostre, não fale”. Uma junção de sutilezas que exploram a psique de seus personagens.

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O filme revela uma história sem muitas surpresas e um pouco morna, porém, seu elenco de peso consegue fazer com que tudo flua leve e permite de o telespectador reflita sobre os acontecimentos, os hábitos e a cultura da época, uma vez que, tudo acontece em meio ao cenário da guerra civil americana,  em 1864.

Tudo se inicia quando a garotinha Amy (Oona Laurence), ao ir colher cogumelos, acaba encontrando um soldado yankee ferido aos pés de uma árvore, em sua bondade e seu dever cristão a menina acaba oferecendo abrigo em uma escola de moças, da qual pertence. Quando chegam a escola a presença masculina do soldado acaba gerando um certo alvoroço.

A escola é comandada por Martha Farnsworth (Nicole Kidman), que recolhe o soldado já inconsciente, devido a um ferimento na perna. O soldado é, John McBurney (Colin Farrell), um militar contratado que ao se deparar com a crueldade das batalhas acaba desertando e fugindo. Assim se inicia o dilema de Martha, que precisa escolher entre aceitar a presença do John ou entregá-lo as tropas confederadas.

Enquanto John se recupera, sua presença desperta tensões sexuais entre as moças, isso faz com que elas alteram seu comportamento e perturba o sossego e a rotina na casa, estas tensões ficam bem evidentes entre as três mulheres mais velhas e se reflete no modo de agir das mais novas, neste ponto a gentileza entre sexos fica bem evidente, visto que, ter a presença masculina em casa durante a guerra é escassa e, ter uma concentração feminina neste mesmo período pode aguçar a libido.

Para retribuir os cuidados John começa a trabalhar na casa e fica interessado em Edwina (Kirsten Dunst), ele se declara para ela, que retribui o interesse, mas nada é tão simples e o soldado acaba sendo assediado por Alicia (Elle Fanning) e acaba consentindo seus desejos. Ao mesmo tempo começa a rolar um certo flerte de Martha sobre o John, que deixa tudo confuso e complicado.

John pede para ir ao quarto de Edwina, que nega, então ele sucumbe aos desejos da carne e visita o quarto de Alicia, quando menos se espera são surpreendidos por Edwina, John tentando desesperadamente se explicar tenta conter Edwina que o ataca e derruba-o acidentalmente na escada, sua queda fratura a perna ferida e novamente John fica inconsciente.

A briga acorda a casa toda, Alicia dissimula, Edwina chora e Martha na tentativa de tentar salvar a vida do soldado novamente, resolve amputar a perna de John. Neste momento podemos perceber bem todos os pontos de vista dos personagens, seus princípios, qualidades e crenças. As atitudes de cada um refletem a parte mais forte de suas personalidades, representadas muito bem pelos atores escolhidos.

A decisão de Martha, mesmo salvando a vida de John, não foi bem aceita por ele, que se sente inútil, usado, e, que em uma tentativa de defesa revela um comportamento agressivo colocando em risco todas as moças. Alicia tenta se isentar da culpa, com medo e para evitar uma catástrofe a sua honra, uma das mocinhas incentiva Martha a executar um plano para se livrar de John.

Então, em paralelo as com cenas iniciais do filme, Amy colhe cogumelos novamente, mas desta vez, venenosos. Edwina entende a angústia de John, tenta reconfortá-lo e se entrega para ele, enquanto isso as outras moças preparam o jantar com os cogumelos colhidos. Ao encontrar o jantar servido, todas as moças amáveis e a Edwina lhe dando segurança, John baixa a guarda e consome os cogumelos venenosos. Para encerrar, todas elas deixam o corpo de John para ser levado pelo exército confederado e continuam a vida com seus desalentos e frustações.

Mesmo não sendo um roteiro muito criativo vale a pena conferir o filme, seu desenrolar simples e objetivo permite que possamos refletir sobre as decisões e escolhas que precisamos tomar diariamente, demonstra que é necessário saber em quem confiar, saber rever nossos princípios e principalmente saber rever nossos valores sempre que possível.

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