O cinema LGBTQIA+ ainda tem um longo caminho a trilhar, ainda mais aqui no Brasil. Mas com o filme Alice Junior, temos uma história totalmente centrada em uma personagem trans. O que é ainda melhor: em um filme voltado ao público jovem, que deveria ser assistido por todos.
Dirigido por Gil Baroni e escrito por Luiz Bertazzo e Adriel Nizer Silva, Alice Júnior foi lançado em setembro de 2019, no Festival de Vitória e está disponível no catálogo da Netflix.
Alice Júnior, interpretada por Anna Celestino Mota (uma atriz também trans), conta a história de uma menina chamada Alice, que, por conta do emprego de seu pai, precisa se mudar de um bairro nobre do Recife, para uma cidade pequena no interior do Paraná. Alice é uma jovem cheia de personalidade que faz vídeos para internet de maneira muito extrovertida. Seu pai tem uma relação maravilhosa com ela e sempre a aceitou, assim como sua mãe, já falecida.
Chegando na cidade de Araucárias do Sul, Alice encontra uma cidade mais fechada e conservadora, principalmente em seu colégio novo, aonde recebe olhares atravessados. Logo os professores começam a chamá-la pelo seu “dead name” (nome de registro) e a tratá-la como menino, inclusivo dando-lhe um uniforme “masculino” para ela usar. Além disso, Alice é vetada de usar o banheiro feminino.
Essa transfobia (violência contra pessoas trans) faz com que Alice passe a odiar ainda mais a cidade, pensando que não conseguirá fazer amigos e muito menos ter uma vida amorosa, o que é muito importante para ela, ter seu esperado primeiro beijo. Mas logo algumas pessoas se aproximam dela, como Viviane, Taísa e Bruno. Isso mostra para Alice que nem todos irão ser violentos com ela, não aceitando-a.
A trama da aluna nova recém-chegada a um colégio novo já foi muitas vezes utilizada no cinema, mas, desta vez, temos um filme que inova, dando protagonismo às pessoas que sempre foram tratadas sempre como personagens secundários, muitas vezes estereotipados ou, ainda pior, como motivo de piada.
Alice Júnior quebra essa barreira que existe ainda no cinema e traz uma história sensível, com um roteiro inteligente, e um grupo de atores jovens com muito potencial, destaque principalmente para Anna Celestino Mota, que está perfeita como Alice.
É notável o cuidado que o diretor e os roteiristas tiveram ao tratar do assunto da transexualidade da personagem. Os diálogos são ágeis e com mensagens fáceis de se entender, até para quem não tem muito conhecimento sobre transexualidade.
É importante quando o cinema usa seu espaço para, além de entreter, também informar as pessoas, mostrar vivências diferentes das que estamos acostumados.
Além de mostrar as dificuldades de Alice, o filme também explora a união feminina. Alice sofre com o preconceito, principalmente de seus colegas meninos, e é na união das meninas em defendê-la que Alice percebe que nem todos irão abandoná-la. Isso mostra o quão importante é que o feminismo inclua também mulheres trans.
Alice Júnior é um filme que fala sobre um assunto sério e que merece mais destaque, mas também nos traz momentos engraçados e emocionantes, cativando quem assiste. Alice é uma personagem muito marcante e é lindo ver a importância das amizades e dos amores que encontramos ao longo da vida.